25.11.04

Quentes e boas

O Sr. José tem olhos azuis escuros muito pequeninos.
Boné, cara miúda, e um sorriso que enche a alma.
Acho que não me lembro do Outono em Coimbra sem a nuvem de fumo do carrinho de castanhas do Sr. José a pairar ali ao pé do Gil Vicente. (aliás, acho que é mesmo ele que traz o Outono, as folhas amarelas boas de pisar e os fins-de-tarde melancólicos...)
Passei hoje por ele, e fiquei triste porque estamos quase em Dezembro e eu ainda não o visitei este ano. Não compro castanhas assadas a mais ninguém. Não por capricho ou mania, mas porque vos garanto que ninguém me diz um 'Aqui tem menina' com maior candura.

Thank you for the days

Ontem adormeci numa paz imensa. Profunda, racional, alicerçada num serão de conversa e partilha, cada vez mais essencial para o meu equilíbrio.
Hoje acordei num misto de gratidão e orgulho, sorridente ao rever cada cara, cada gesto, cada desabafo concreto de vidas que são parte da minha.
Obrigada pelos vossos passos em volta.

24.11.04

Abraços de olhar

Esse seu olhar
Quando encontra o meu
Fala de umas coisas
Que eu nem posso acreditar
Doce é sonhar é pensar que você
Gosta de mim
Como eu de você

Tom Jobim

Daqui a 59 horas dou-te o abraço que ando a fazer crescer há quase dois meses...

22.11.04

Saudades do futuro

Da esplanada em vão me projecto para lá donde me sinto. Tento ver sem me ver, na esperança súbita de saber em que movimentos me finto. Naquele entrecruzar constante, neste chocar sem chocar, onde o espaço é quase tudo e o tempo é quase nada, me tento em vão ver passar.
Uns vão rindo outros sorrindo, outros vão de rosto mudo, há quem simplesmente vá numa fé que o vento varra tudo...


Trovante

E há quem simplesmente tenha este dom de pôr em palavras o que eu não consigo dizer, o que me vai consumindo de incertezas quando me sinto pouco mais que espectadora de vidas.

Dias ao de leve

Há dias em que devia ser obrigatório sair-se de casa de pantufas. Passar o dia em pézinhos de lã, sem fazer barulho e sem pisar com força. Dias de bailarina, delicados, suaves, que tocam sem incomodar.

19.11.04

Angelorum

Anjos, arcanjos, tronos, potestades, dominações, virtudes, principados, querubins e serafins.
Fascina-me desde sempre este 'mundo alado' de figurações encantadoramente poéticas e misteriosas. Da representação enternecedora de Bouguereau, aos anjinhos de barro da APPACDM, passando pelo olhar de Wim Wenders numas Asas de Desejo intermundos ou pelos puti barrocos da Sé Nova, é ao som dos U2 que mais vezes me questiono: If God Will Send His Angels?...

18.11.04

Significados II

A primeira conversa romântica...

Positrão s. m. - electrão positivo; partícula de massa igual à do electrão e de carga eléctrica do mesmo valor absoluto, mas positiva, de vida efémera, existente nas radiações de certos elementos de radioactividade artificial, e nos raios cósmicos, cuja fusão com um electrão provoca o aniquilamento das massas e o aparecimento de fotões.

O concerto já tinha acabado, nos meus pés 'aquelas' sandálias brancas, uma caneca de Long Island à minha frente e o ambiente esfumado que só o Piano Negro sabia ter, a dar ambiente à conversa.

17.11.04

Significados I

Reza assim o meu dicionário:
Encontro, s. m. O acto de encontrar-se com alguém. Embate, choque. Obstáculo, objecção. (...)

1-4, ganha o pessimismo e eu começo a desanimar...

16.11.04

Black Bird

Disse-me há pouco tempo um amigo, que o belo só existe em cada um de nós por aquilo que nos evoca. No meu cofre-forte guardo com muito carinho um passeio emotivo por Amesterdão, em que presenciei a insanidade de um homem a crescer de tela para tela, num voo sem rumo.
Mais tarde redescobri este Black Bird pela voz da Maria João e apeteceu-me juntá-los.
Não há como explicar, arrepio-me, comovo-me, dou graças, sorrio...



Blackbird singing in the dead of night
Take these broken wings and learn to fly
All your life
You were only waiting for this moment to arise

Blackbird singing in the dead of night
Take these sunken eyes and learn to see
All your life
You were only waiting for this moment to be free

Blackbird fly, blackbird fly
Into the light of the dark black night
Blackbird fly, blackbird fly I
nto the light of the dark black night
You were only waiting for this moment to arise
You were only waiting for this moment to arise

Lennon/McCartney

15.11.04

guidinha

Aqui vai uma confissão: nos dias de muita fúria interior, gente mesquinha ou chuva torrencial, venha de lá uma chávena a transbordar do meu predilecto English Rose, e uma ou duas redacções da Guidinha, intemporais, na pena avant garde do Luís de Sttau Monteiro.
Bom proveito!

As Chaves

Antigamente usavam-se umas chaves de porta grandes que precisavam dumas fechaduras grandes com uns buracões grandes por onde se espreitava bem o olho sentia-se à vontade e uma pessoa gozava sem cansar a vista depois inventaram umas chaves chamadas Yale que entram nuns buraquinhos fininhos que parecem frestas de portas e que cansam a vista é por isso que tanta gente usa óculos é uma indecência dá cabo da vista à gente e as pessoas começam a desistir de andar informadas daqui a pouco ninguém sabe o que é que fazem os vizinhos e a vida é uma chatice tão grande que muita gente vai suicidar-se sim se a gente só sabe o que faz e não sabe o que os outros fazem para que é que se vive lá na minha escola a professora diz que a ciência é filha da curiosidade houve um homem que estava a dormir debaixo duma macieira vai caiu-lhe uma maçã em cima da penca e ele teve tanta curiosidade que descobriu uma lei chamada a lei da gravidade que é a lei que diz quando é que as maçãs caem das árvores na terra dele sim porque na minha não caem por causa da gravidade caem por estar maduras mas as maçãs se calhar variam de terra para terra ora a verdade é que se o tal homem tivesse tido uma fechadura Yale entre o olho e a maçã não tinha descoberto nada tinha ficado com a vista cansada e as maçãs por não saberem a tal história da gravidade tinham continuado a cair da bicheza e da madureza o que fazia muita diferença lá porquê não sei mas toda a gente diz que sim eu é que não desisto e continuo a espreitar mesmo que todas as fechaduras sejam Yale agora por causa disso ando com os olhos a arder (...)

Luís de Sttau Monteiro

13.11.04

Ursices



Correndo o risco de tornar este blog pouco sério, resolvi 'postar' um urso.
Este, em particular, é um urso Forever Friends, que povoou a minha adolescência estampado em postais, canecas, material didáctico e incontáveis bilhetinhos intra-aulas.
Nunca percebi exactamente o porquê de ser o urso o animal-brinquedo de peluche de eleição, mas confesso-vos que me despertam uma imensa simpatia. O primeiro que tive, ainda antes de nascer, é grande, de pêlo curto e pouco macio, e parece cheio de esferovite. Teve direito a um grande laçarote de cetim azul ao pescoço, a condizer com os olhos, e grande parte da sua existência passou-a em lugar de destaque, sentado à cabeceira da minha cama.

The History Of The Teddy Bear

In 1902 President Theodore Roosevelt was on a hunting trip in Mississippi. As reported in the Washington Post, the presidential hunting party trailed and lassoed a lean, black bear, then tied it to a tree. The president was summoned, but when he arrived on the scene he refused to shoot the tied and exhausted bear, considering it to be unsportsmanlike.
The following day, November 16, Clifford Barryman, Washington Post editorial cartoonist, immortalized the incident as part of a front-page cartoon montage. Barryman pictured Roosevelt, his gun before him with the butt resting on the ground and his back to the animal, gesturing his refusal to take the trophy shot. Written across the lower part of the cartoon were the words "Drawing the Line in Mississippi," which coupled the hunting incident to a political dispute.
The cartoon drew immediate attention. In Brooklyn, NY, shopkeeper Morris Michtom displayed 2 toy bears in the window of his Stionary and novilty store. The bears had been made by his wife, Rose from plush stuffed excelsior and finished with black shoe button eyes. Michtom recognized the immediate popularity of the new toy, requested and received permission from Roosevelt himself to call them "Teddy's Bears."
The little stuffed bears were a success. As demand for them increased, Michtom mooved his business to a loft, under the name of the Ideal Novelty and Toy Corporation.
At the same time as it was born in The United States, the Teddy Bear was also born in Germany. The Steiff Company of Giengen produced it's first jointed stuffed bears during the same 1902-1903 period. The company had made toys for a number of years and had produced small wool-felt pincushion type animals of many varities. The animals were the creation of Margaret Steiff. Steiff bears were first introduced at the 1903 Leipzig Fair, where an American buyer saw them and ordered several thousand for shipment to the US.

11.11.04

(des)(en)caminhar



Caminante, son tus huellas
el camino, y nada más;
caminante, no hay camino,
se hace camino al andar,
Al andar se hace el camino,
y al volver la vista atrás
se ve la senda que nunca
se ha de volver a pisar.
Caminante, no hay camino,
sino estelas en el mar.

Antonio Machado

Sempre gostei de palavras com prefixos e sufixos. Sobretudo os paradoxos de sentido que daí advêm e que são absolutamente verdade. Caminho que é percurso encaminha-se nas certezas de uma chegada ou esboroa-se nos passos em volta de um 'des' que a viagem não quer deitar fora?
É a mais surpreendente lição de vida, feita de acasos, encontros fortuitos e desilusões. Perder, chorar, procurar de novo. Cair e erguermo-nos a custo. Coxear até aprendermos a andar sem medo.
Caminhar.

8.11.04

Ao som de Adriana...


Avião sem asa, fogueira sem brasa
Sou eu assim sem você
Futebol sem bola,
Piu-Piu sem Frajola
Sou eu assim sem você

Por que é que tem que ser assim
Se o meu desejo não tem fim
Eu te quero a todo instante
Nem mil alto-falantes vão poder falar por mim

Amor sem beijinho
Bochecha sem Claudinho
Sou eu assim sem você
Circo sem palhaço,
Namoro sem abraço
Sou eu assim sem você

Tô louca pra te ver chegar
Tô louca pra te ter nas mãos
Deitar no teu abraço
Retomar o pedaço
Que falta no meu coração

Eu não existo longe de você
E a solidão é o meu pior castigo
Eu conto as horas
Pra poder te ver
Mas o relógio tá de mal comigo
Por quê? Por quê?

Neném sem chupeta
Romeu sem Julieta
Sou eu assim sem você
Carro sem estrada
Queijo sem goiabada

Sou eu assim sem você
Por que é que tem que ser assim
Se o meu desejo não tem fim
Eu te quero a todo instante
Nem mil alto-falantes vão poder falar por mim

Eu não existo longe de você
E a solidão é o meu pior castigo
Eu conto as horas pra poder te ver
Mas o relógio tá de mal comigo
Por quê?

2.11.04

All Saints

Em dia de Todos os Santos a minha eterna relação de amor-ódio com cemitérios volta à baila. Aflige-me tanto a afluência nestes dias de vendedores de flores e velas com um ícone de Cristo, (preferencialmente de peito aberto em chaga e tez branca de leite), como nos dias normais me afligem as rosas de plástico com pintas de cola transparente em jeito de água fresca acabadinha de borrifar, com cores tão berrantes, que não soubéssemos nós que de plástico são feitas, acreditávamos estar perante um milagre de cor geneticamente modificada.
Respeito profundamente os nossos ritos, mas entristeço-me com eles. Temos obrigações físicas post-mortem. Dias marcados na agenda, cores interditas, vocabulário arejado e positivo sobre os 'santinhos' que já lá estão. Choramos, carpimos, falamos baixinho e vamos sofrendo a dor genuína, sempre muito mais sentida e lúgubre quando nos nossos folclóricos cemitérios.
Venham de lá placas de pedra branca, lisa, e hectares de relva, flores com raízes na terra, árvores e piqueniques. Crianças a brincar e a falar alto, num espaço que pode e deve ser exemplo de vida.