30.11.05

a muitas mãos

Rodou o puxador metalizado da porta a 180 graus e fechou-a devagarinho atrás de si, invertendo o sentido do puxador e do futuro. Caminhou estrada fora durante uns minutos, sempre a olhar para A janela, mas quando chegou ao final da rua foi como se lhe tivessem partido um serviço de loiça na boca do estômago. Começou a correr e só parou quando já não conseguia aguentar a dor de burro. “Já está, consegui”, disse o cérebro ao corpo, enquanto os olhos se fixavam na sua triste figura reflectida nos painéis publicitários das paragens de autocarro.


Podia ter acontecido ontem ou cinco anos atrás. Sentia agora que, se calhar, tinha sido preciso passar aquele tempo todo: exactamente seis anos, dois meses e catorze dias.
Enquanto recuperava o fôlego da corrida (afinal, porque lhe faltava o ar, logo a ele, que estava habituado a abusar do corpo, a levá-lo tantas vezes ao limite onde a taquicardia definitivamente acaba?), cruzou-se com a memória desse dia.

Trazias uma t-shirt branca não muito justa, o cabelo solto e um sorriso que me desarmou ao primeiro olhar. Pediste-me que tirasse a camisa e me deitasse num tom de voz tão baixo que me foi difícil perceber o que dizias. Obedeci-te prontamente, expectante. Observei todos os teus gestos: o acender do incenso, o correr da persiana, o gesto profissional com que aquecias sempre as mãos uma na outra.

(uma história a precisar de outras tantas madrugadas...)

26.11.05

questa notte


Password, Ludovico Einaudi

Para além de tudo o que me estampou um sorriso na cara
e me fez sentir (e agir!) miudinha, a certeza de que o que vale
realmente a pena é tão simplesmente ter-vos comigo.

25.11.05

turbilhão

Dói-me: a mais longa promessa da minha vida não foi de alma, não foi de entrega, não foi a alguém.
Hoje era preciso chuva.
Que me lavasse por dentro e por fora. Mais forte que o meu sorriso contristado, mais forte que a minha vontade de não cair de novo na devastadora tentação do e se...
Hoje era preciso sol.
Que me secasse esta torrente de ideias descompassadas, que me iluminasse o futuro agrilhoado a um cofre, me passasse as mãos pelo cabelo e me conseguisse realmente convencer a não ficar triste.

23.11.05

simples (III)

«...porque a gente ainda não sabe qual é a pergunta, mas já aprendeu que o amor é a resposta»

(mais um roubo de palavras, desta vez para a travessia do Inverno)

simples (II)

«Dai-me apenas Senhor,
O Vosso Amor e Graça
Que isso me basta.»

Sto. Inácio de Loyola

21.11.05

simples (I)

«É preciso amar as pessoas como
Se não houvesse amanhã
Porque se você parar para pensar
Na verdade não há.»
Renato Russo/Legião Urbana

18.11.05

acordei

a sentir-me um perfeito armazém de perdidos e achados.

...

Alguém faz o favor de pôr ordem nesta casa?

«I'm not a stranger in the hands of the Maker»

15.11.05

purple heart


- sem agulha
- sem domínio da técnica
- sem coragem para descobrir o fio à meada

14.11.05

(...)

Comecei a história. Sonhei-lhe um início, um meio e uma eternuridade.
Continuo a acreditar que nela sou feliz e a cada linha que acrescento aceno-te.
Não te esqueças do selo meu amor.

12.11.05

ser presente

And in high seas or low seas,
I'm gonna be your friend,
I'm gonna be your friend.
Said, high tide or low tide,
I'll be by your side,
I'll be by your side.

10.11.05

à lupa

A Rosa do Mundo é maior do que uma Bíblia em ponto grande.
Ocupa-me um espaço enorme na segunda prateleira da estante, e entre nuvens desfocadas deixa-me todos os dias um recado: 2001 poemas para o futuro. Não os li todos. Gosto de a abrir (sim, porque este é um livro no feminino!) ao acaso e de vez em quando, e surpreender-me com palavras de outrem. Uma excepção apenas: Ramos Rosa. O marcador azul escuro está na mesma página desde o primeiro desfolhar.

...
não posso adiar para outro século a minha vida
nem o meu amor
nem o meu grito de libertação
Não posso adiar o coração.

Depois de anos a lutar comigo mesma e com os epítetos de pseudo-queridez que tantas vezes me camuflam e reduzem a pouco mais que um sorriso e a uns olhos piscantes, fui desarmada. Disseram-me esta semana que andava numa fase particularmente doce e eu, finalmente, percebi.
Pode alguém ser quem não é?

8.11.05

The space between
What's wrong and right
Is where you'll find me hiding, waiting for you
The space between
Your heart and mine
Is the space we'll fill with time
The space between...

6.11.05

chega

Não quero ser cega, nem surda, nem insensível, nem alheada da realidade, mas há coisas que eu, definitivamente, não preciso mesmo de saber.

4.11.05

Gostava tanto de ser corajosa!

3.11.05

reencontros

«E de novo acredito que nada do que é importante se perde verdadeiramente. Apenas nos iludimos, julgando ser donos das coisas, dos instantes e dos outros. Comigo caminham todos os mortos que amei, todos os amigos que se afastaram, todos os dias felizes que se apagaram. Não perdi nada, apenas a ilusão de que tudo podia ser meu para sempre.»
Miguel Sousa Tavares
Obrigada.

2.11.05

sinto-me

desconcertada_curiosa_serena_baralhada_grata_expectante_acelerada
_frágil_feliz_amedrontada_titubeante_perdida_certa_insegura_

(achas que algum dia conseguiremos acabar este jogo de escondidas?)